A cidade de Petrópolis, além da beleza dos seus monumentos históricos e da variada arquitetura, como também de sua rica e bela tradição, tem para mim um encanto a mais. Durante uma boa parte da minha vida foi a minha cidade. Lugar onde comecei a aprender a ser padre no Seminário Diocesano Nossa Senhora do Amor Divino e, posteriormente exerci durante 20 anos o ministério sacerdotal em meio às muitas missões que por lá tive a oportunidade de desempenhar. Aprendi a orgulhar-me daquela cidade na Serra que encanta com facilidade a todos os que têm o privilégio de conhecer ou visitá-la.
A tragédia causada pelas chuvas desta semana marcou com uma página triste o livro da História da Cidade Imperial. Identificar entre as vítimas nomes e rostos conhecidos, lembrar sorrisos do passado, silenciados pela violência da catástrofe, ver histórias contadas que guardarão a marca de muitas saudades, de fato, causam dor profunda na alma e não deixam de provocar tantas perguntas.
É normal e oportuno que nesta hora haja questionamentos sobre responsabilidades. Sempre que o infortúnio bate à porta conjecturamos sobre como poderíamos ter impedido a visita inoportuna. A vida é mestra e ensina a dar passos mais seguros à medida que os anos avançam e acumulam-se experiências. Porém, é necessário também abrir os olhos e enxergar a realidade toda que nos envolve. A dor sozinha tende a paralisar e deter os passos. Mas o que fazemos com ela? Afinal, é preciso seguir caminhando. A urgência do momento pede movimento. O fato trouxe consigo, além de perguntas, muitas respostas. Talvez não aquelas que buscávamos, mas as que imediatamente necessitávamos.
Muitas mãos se juntaram para orar e para ajudar. Um desejo e uma prática concreta de serviço dominaram o coração de tanta gente que, espontaneamente, deram-se as mãos para socorrer as vítimas e fazer chegar ajuda de todos os lados, num esforço coletivo de superação e de reconstrução.
Uma amiga, moradora de Petrópolis, numa mensagem, lembrando o drama de um amigo nosso que perdeu esposa, filhos e sogros, numa frase me ajudou a tentar ler algo desse ‘livro de palavras embaralhadas’. Disse-me assim: “muito triste pela família de ‘fulano’, e muito grata por ter podido contemplar uma história tão linda de amor! ‘Fulana’ sempre tão doce…”
Para levantar a cabeça da angústia dos fatos ela me ajudou a aprender conjugar dois sentimentos presentes na vida: tristeza e gratidão. Nesta hora, entendi mais uma vez que a gratidão pode ser parte da força necessária para a reconstrução. O que se vive de belo não morre, o amor não morre, mas vive para sempre. Digo “parte da força necessária” porque a outra mais necessária vem de Alguém, vem de Deus, vem da fé, vem da esperança na vida plena e eterna, onde, como diz a Escritura, “Deus enxugará toda lágrima dos olhos” (Ap 21,4). Não coloquemos Deus no banco dos réus dos culpados, porque Ele, ao longo da História, quis se colocar do lado das vítimas. Fez-se Ele mesmo, em Cristo, vítima por nossos pecados. E no castigo que lhe sujeitaram, o tormento da Cruz, lá Ele venceu pelo amor e nos mostrou, no amor, a força que supera tudo. O amor cura as feridas e dá força nova para continuar a escrever novas histórias de amor, como as tantas que são narradas nesses dias. O amor sempre vence!
Nesses dias, em Petrópolis, temos visto uma enxurrada de solidariedade. Diante da violência das intempéries, a resposta do coração humano tem sido tornar-se presente, estender as mãos, abrir o coração e colocar-se do lado de quem está sofrendo.
Há duas invocações de Nossa Senhora muito próprias de Petrópolis: Nossa Senhora da Saudade e Nossa Senhora do Amor Divino. Uma, no Carmelo da cidade, e outra no Santuário de Corrêas. A saudade reclama o consolo. A Mãe de Jesus, como fez com o Filho, coloca-se ao lado com a força do seu amor. Que também nós nos coloquemos do lado de quem sofre nessa tragédia, tantos… e, como Deus, façamos sempre a escolha preferencial de estar do lado dos pequenos e sofredores.
Rezemos… ajudemos!